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MERIVALDO PINHEIRO

I. Sobre o autor

Poeta, educador, Merivaldo é paraense, 36 anos, filho de Samaumeiras e Jequitibás da Amazônia. Atualmente, Reside no Rio de Janeiro, onde oportunamente participa de eventos ligados à Literatura, sobremodo à poesia. Por exemplo, esteve no Circo Voador em 2005. Possui dois livros de poemas prontos, e trabalha em um de conto para 2006. Site/Blog: http://www.merivaldopinheiro.zip.net


II. Suas Obras


À Venda

Crianças miúdas soterradas
e seus pais desaparecidos
e suas casas sem portas
e sem janelas
e sobreviventes sem nenhuma fagulha de esperança.

Lembranças de gente jaz
plantadas à boca da noite
de onde vem o sol.
E, pela manhã, rubis em leite
servidos nas manchetes de jornais.

À venda
Jazigos instantâneos nascidos de mísseis ou bombas
e robôs de carne e osso e explosivos
que acompanham controle remoto.

Baterias antiaéreas
e aviões invisíveis
e caça-humanos
e montanhas-labirintos.

À venda
Cartas sem remetentes, porque, sem perfume,
estão abarrotadas de pó na contramão.
E abridores descartáveis de envelopes
que acompanham kit astronauta.

Tubos de ensaio
e seus elementos químicos aplicados em solução.
E manuais de Hitler e de vietcongues.
E um velho Alcorão não mais soterrado.
E um porta-retratos sem barba
com o vidro quebrado e empoeirado.
E uma ideologia e uma religião.

À venda
Cartas de amor
presas na alfândega.
E parentes e amigos sem notícias
que morreram de ansiedade e apreensão.

Um punhado de luz de sol
armazenado em vidros esverdeados
sem o selo do Inmetro.
E um punhado de raro silêncio
colhido em grutas subterrâneas
e armazenado em caixas de papelão.

À venda
Teimosia e desunião
e desgraça e destruição
(tudo em spray).
E pílulas de desrespeito e desamor
de ódio e vingança.

Olhos que lacrimejam desesperança e dor.
E saudades distantes.
E mãos corajosas, que empunham armas,
agora ceifadas e cobertas de terra.

À venda
Um coração partido em cruz por depressão.

Grátis
Orações de Marias de todo o mundo.
E remédios e alimentos e pedidos de paz.
(Distribuem-se sementes de perseverança).

Uma mulher, que não está à venda,
corre em uma pentagonal.
Sua burca se desprende.
Escondia a face da desalegria e do desespero.

Uma criança se ajoelha e pede paz.

Estrelas explodem no céu.
E não são fogos de artifício.

A noite caiu de repente.


À Beira-Rua

Uma pedra sobre a outra, e muito poucos pensamentos.

Desejos se perdem no muro
enquanto crianças passam correndo.

Grãos de pedra ardendo de febre
imploram uma gota de orvalho.
Mas o sol ainda está alto, e a Terra gira lentamente.

Sapatos maduros de todas as idades
procuram as boas novas nos classificados.
Mas os classificados não têm passaporte.
É preciso andar sobre trilhos e escalar arranha-céus.

Corações em silêncio, dentro dos bondes,
partem em mais uma jornada. A vida não mudou.
As mesmas pessoas, os mesmos horários,
o mesmo bonde e a mesma rua.
Caminhar é preciso. Só chega quem caminha.

Alguns desapercebidos na calçada.
Inertes ao movimento dos carros.
Imóveis ao movimento das gentes.
É preciso levá-los à lua ou tirá-los de lá?

A aurora desperta sol claro.
É o leiteiro o jornaleiro o padeiro.
É o movimento dos homens.

É o movimento da rua
com seus sonhos dormidos à beira.

Uma gente sobre a outra, e muito poucos sentimentos